Exaustão

Conselheiro Lafaiete, 17 de abril de 2024

Querida mãe,

Como vão as coisas por aí? Anda muito cansada? Na verdade, acho que a pergunta deveria ser outra, você já “surtou” de cansaço? Eu já e uns dias atrás meu irmão me lembrou deste episódio, que eu havia esquecido.

Isso aconteceu há alguns anos quando minhas filhas eram crianças, uma tinha 5 anos e a outra 3 aninhos. Lembro que no intervalo de almoço, eu fui a uma agência de turismo fechar nossa viagem de férias em família. E neste momento, eu tive um pequeno contratempo, acho que foi uma questão com o cartão de crédito. Algo simples, porém grande o bastante para ser um gatilho para eu começar a chorar sem parar e a reclamar horrores com a atendente. 

E ela me olhava e tentava me consolar, mas sem entender muito bem o que poderia estar acontecendo. E não adiantava, pois tudo que ela falava eu contra-argumentava. Saí de lá desesperada, aos prantos.

Fiquei bastante desconfortável e intrigada com meu comportamento e quando voltei para casa após o trabalho, fui refletir para tentar compreender o que estava acontecendo. E naquele momento, para mim, não fazia nenhum sentido aquela forte crise que se instalou no planejamento de algo tão prazeroso que é viajar em família. E foi então, neste instante de introspecção que eu percebi o quanto estava exausta. Exausta de tudo e de todos. Exausta da família. Exausta de compromissos. Exaustas de buscar ser exemplo. Exausta de ser mãe. 

Lembrei-me de quando criança ouvir a minha tia dizendo que desejava adoecer para ficar internada no hospital por alguns dias e descansar. Eu ouvia aquilo e não entendia o porquê, para mim não havia sentido algum. Naquele momento passei a compreender a necessidade da minha tia de necessitar de um tempo. E uma necessidade tão intensa e desesperadora que a fazia pensar que adoecer poderia ser a solução. 

E assim, como ela, eu também precisava de tempo, de ficar sozinha, de fugir das regras. De descansar. Então, decidida, “despachei” marido e filhas para a casa da sogra, eu não queria nem adoecer e nem hospital.

Na verdade, não foi bem assim, eu percebi que não tinha condições físicas e mentais para cumprir os compromissos do fim de semana, que neste caso incluía também o casamento do meu cunhado. Informei a todos que não estava bem, mas nesta altura do campeonato, como dizemos aqui, eu não precisava falar muito, bastava olhar para mim, pois todo o meu corpo e semblante demonstravam a minha exaustão. Disse que não iria a lugar algum e passaria o fim de semana em casa sozinha.

E assim, aconteceu. Quando a casa ficou vazia, senti um alívio enorme. E uma gostosa sensação de depois de muito tempo poder escolher o que fazer. Fazer coisas por mim. Ficar o dia inteiro maratonando algo na TV sem me importar. Dormir na hora que estiver com sono. Almoçar batata frita e jantar sorvete, sem culpa nem remorso de estar sendo um péssimo exemplo para as minhas filhas. Passar o fim de semana inteiro de pijama sem sentir julgamento nos olhares das pessoas. 

Quando minha família voltou no domingo à tarde, eu me sentia renovada, leve com uma pluma, feliz e os recebi com um sorriso largo no rosto.

E meu cunhado? Entendeu o meu momento, pois uns anos depois me chamou inclusive para batizar sua filha e hoje somos compadres. Na verdade, nem sei se ele se recorda disso, ainda não tivemos a oportunidade de conversar sobre este fato. 

E este foi um momento que eu descobri a importância de reconhecer o meu cansaço e meus limites. Não somente reconhecê-los, mas também respeitá-los. E pela primeira vez percebi que às vezes, o que me torna uma mãe melhor é ficar longe das minhas filhas por um tempo. E que isso não tem nada a ver com o amor que sinto por elas.

Com o coração leve em relembrar este fato, me despeço.

Tenho 47 anos e sou mãe de duas adolescentes com 15 e 13 anos.


GOSTOU DA CARTA E QUER ENVIAR UMA PRA GENTE?

Deixe um comentário