Aprendendo a olhar minhas filhas

Conselheiro Lafaiete, 12 de janeiro de 2024

Olá, como vai?

Eu fiquei muito comovida e reflexiva ao ler o livro Geração do Quarto do Hugo Monteiro. A partir dos seus estudos com adolescentes em diferentes capitais brasileiras, ele descreve a existência de uma geração de jovens em sofrimento e adoecida emocionalmente. O livro cita casos de jovens que não aguentaram o sofrimento ou ódio interno, dando vazão a esses sentimentos de maneira trágica para si mesmos e muitas vezes envolvendo outras pessoas. O que me chamou bastante atenção foi que esses fatos surpreendem fortemente seus pais e familiares, pessoas próximas. Será mesmo que esses jovens não sinalizaram nada? Será mesmo que eles em nenhum momento pediram ajuda?

Eu acredito que sim, que eles sinalizaram e pediram ajuda. A questão é que provavelmente esses sinais e pedido de ajuda foram demonstrados de maneira que nós, pais, não aprendemos a decifrá-los. Como se eles falassem outra língua. 

A partir dessa experiência e desta crença, eu entendi que precisava estar mais atenta com as minhas filhas. Afinal de contas, será que há mesmo muita diferença entre esses jovens e minhas filhas. Ontem mesmo estava assistindo a um filme chamado Destemida, que é baseado em uma história real que conta a trajetória da velejadora australiana Jessica Watson que conseguiu a proeza de dar a volta ao mundo velejando aos 16 anos, uma viagem com duração de 210 dias. E ao final, ao conseguir, no seu discurso, ela diz: sou uma adolescente comum. Uma fala presente também nas situações de tragédia, eram adolescentes comuns. 

O que me fez refletir qual é a diferença desses adolescentes comuns? E sabe qual conclusão eu chego? Realmente, são ambos adolescentes comuns. E adolescentes comuns têm potencial para fazer algo extraordinário, podendo ter resultados surpreendentes, nos dois limites. 

Porém, quando esses adolescentes comuns percebem que possuem o apoio e o incentivo de adultos bem-intencionados na sua relação, eles nos surpreendem positivamente. Quando esses adolescentes comuns não percebem este apoio, e buscam apoiar-se em outros adolescentes, eles nos surpreendem negativamente. 

Cabe aqui uma observação, a importância de entender que a percepção é do adolescente e não nossa, como adulto. Eu, por exemplo, faço muitas coisas pensando em minhas filhas, buscando atender as necessidades que eu imagino ser delas, mas não sei se todas elas são percebidas dessa maneira, ou se são mesmo as prioritárias.  

Essas reflexões, portanto, me incentivam diariamente a olhar com mais cuidado para as minhas filhas e buscar ver e entender o que está além das palavras. O que elas expressam no comportamento, no semblante, nos hábitos. E através desses cuidados e dessas observações, buscar diferentes estratégias de estar próxima, entendê-las para apoiá-las no que estiver condizente com os nossos valores e conversar sobre o que não está muito bem alinhado. E quem sabe, conseguir destrancar e às vezes até abrir portas para o diálogo e a troca.

Procuro observar o semblante delas, quando chegam de suas atividades, se estão falantes ou caladas, os hábitos alimentares, o tempo de tela, as mudanças na forma de vestir, frases e palavras que aos poucos vão se incorporando na comunicação, o que elas estão se interessando no momento, com quem elas estão convivendo mais. Fatos do dia-a-dia. 

Estou aprendendo a olhar de verdade para elas. Sei que estão em um momento de mudança em suas vidas e isso é maravilhoso. E o mais incrível é que com esse comportamento, além de me aproximar delas, acompanhar um pouco mais próximo toda essa transformação, eu aprendo. E como aprendo. Aprendo sobre elas, aprendo sobre mim e sim aprendo muitas coisas sobre esse mundo emergente. 

Às vezes fico assustada com tanta coisa acontecendo, muitas vezes perco sono a noite preocupada com tudo isso, mas acima de tudo, acredito a cada dia mais, na capacidade de cada uma delas. E isso me ajuda a ser uma mãe menos “neurada” e evita alguns surtos. 

Tenho 46 anos e sou mãe de duas filhas com 15 e 13 anos.  


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